O primeiro rascunho deste texto era ridiculamente negativo. Comecei-o no meu dia de anos, dia que, historicamente, é um mau dia para mim. Bom, não foi sempre assim.
Como todas as crianças, eu adorava fazer anos. Deixei de gostar tanto na adolescência, quando o mau-feitio meteorológico de janeiro me atrapalhava os planos de festejo. Por volta dos vinte anos, tornou-se mais agridoce ainda e, aos trinta, eu já detestava fazer anos.
O meu avô paterno costumava dizer que, no aniversário, não estava a contar mais um ano, mas sim menos um ano de vida. E eu ouvi isto tantas vezes que se tornou parte de mim.
Mas, depois, aconteceu ter tido um dia de aniversário mesmo bom, este ano, alimentado pela oportunidade de fazer o que mais gosto e pelo entusiasmo dos meus filhos. Entre os vários presentes que recebi, estava uma ida a Paço de Arcos para participar no Clube de Escrita da Mónica Menezes. Sob o mote" “vida” e com base em palavras aleatórias, saiu-me uma frase que é uma espécie de mantra para 2025.
Sim, as contas para pagar não têm graça nenhuma e ser adulto tem mais desvantagens do que aquelas que prevíamos. Há dias que são uma valente merda. Mas a vida, no geral, é bonita.
É bonita quando abraças alguém de quem gostas.
É bonita quando encontras as palavras certas e o que escreves te sabe a poesia.
É bonita quando fazes o que gostas e, por um momento, te esqueces das contas da pagar e das merdas da vida.
Afinal, a vida é tão bonita.
Por isso, depois de sair do clube da Mónica, apaguei o rascunho que tinha guardado e escrevi este texto.
Para partilhar convosco a parte mais bonita da vida 💜
3 coisas para ler
3 livros que li em janeiro.
Coração Mais que Perfeito, Sérgio Godinho
Há uns dez anos, na altura em que o Sapo era um motor de busca popular (sim, miúdos, o Sapo era O motor de busca em Portugal), havia regularmente passatempos para ganhar bilhetes para o cinema e concertos. Num desses passatempos, ganhei a possibilidade de ir assistir ao ensaio geral do concerto do Sérgio Godinho.
Eu ouço Sérgio Godinho desde que me lembro de ser gente. O Homem Fantasma faz-me rir desde que me lembro de saber falar. A Balada da Rita é uma das minhas músicas favoritas. Não consigo passar pelo segundo dia da semana sem cantar É terça-feira, feira da ladra, abre hoje às cinco da madrugada. Percebem o nível de excitação com que fui.
E fui, levei o namorado, assisti ao concerto maravilhada, mas o meu fascínio morreu um bocadinho quando, trocando algumas palavras com o cantor, percebi que ele duvidava que eu gostasse realmente de o ouvir.
Foi com essa ideia dele com que fiquei e nunca mais voltei a ouvir as músicas da mesma forma. E foi meio contrariada que peguei neste livro.
O Sérgio Godinho é um excelente contador de histórias, mas conta-as bem mais habilmente pela música do que pela prosa. O Coração Mais que Perfeito ficou, para mim, muito aquém daquilo que ele sabe fazer com uma guitarra na mão.
Toda a Gente Nesta Sala Um Dia Há de Morrer, Emily R. Austin
Ri e chorei, ao ler este livro. Identifiquei-me com a protagonista e com os cenários inusitados onde a consciência da inevitabilidade da morte lhe cai em cima como um balde de água fria. Pode ser um gatilho, especialmente se estiverem numa fase mais sensível.
Circe, Madeline Miller
Eu tinha uns doze anos quando o meu tio Rui me ofereceu um livro sobre mitologia grega. Não eram histórias, era uma espécie de compêndio da mitologia, onde podia procurar por categoria (deuses, semi-deuses ou mortais) e ordem de importância.
Não faço ideia onde terá ido parar esse livro, mas o gosto pela mitologia ficou e foi renovado quando, em 2024, comecei a ler ficção baseada em mitologia, seguindo as sugestões da Rita da Nova. E eis que adotei este tipo de ficção como a minha fantasia.
Circe é uma semi-deusa a quem é dado um castigo: o exílio. Mas, mais grave do que o exílio, é o permanente sentimento de não se sentir pertencente a nenhuma categoria. Condenada à imortalidade, mas com a sensibilidade dos mortais, Circe é a feiticeira que escolhe o caminho mais difícil.
Da autora, recomendo também o Canto de Aquiles.
2 coisas para pensar
Duas partilhas que achei interessantes.
O Relatório & Contas da tua vida
Durante alguns anos, ajudei a rever, editar e paginar o Relatório & Contas de uma grande empresa. Era um trabalho pesado, muitas vezes monótono, porque entre tanto número e tanta conversa, eu não via a lógica de perder tanto tempo naquilo. Perguntava-me frequentemente quem é que tinha interesse naquele tipo de coisas (e depois conheci o meu marido).
Uns anos depois, conheci o trabalho do Mathias Jakobsen e os seus Annual Reports - uma espécie de relatório e contas da vida. Todos os anos, ele monta um documento onde reporta os principais acontecimentos, balanços e planos para o futuro.
E este, meus amigos, é um relatório que eu não me importo de ler.
Afinal, o que é o DeepSeek?
Sem perceber muito sobre o assunto, sou fã de tecnologia. Sei que a maioria das pessoas que, de alguma forma, estão relacionadas com a criatividade consideram a IA como o sétimo cavaleiro do apocalipse, mas eu não me incluo nessa equipa. Uso o ChatGPT diariamente e, sim, também o uso para me ajudar na escrita.
Só que eu sou só uma curiosa e a minha compreensão sobre as ferramentas é limitada. No entanto, fiquei interessada em perceber o sururu à volta do DeepSeek. Se forem como eu e quiserem perceber melhor, este post do Tiago Belotte ajuda muito.

1 exercício
Um exercício para desbloquear a criatividade.
2025 é, também, um ano para explorar mais o offline. Já o tenho feito com o crochet e a pintura mas, este ano, quero passar a escrever mais à mão. O exercício que vos trago hoje é inspirado nas partilhas da Elsa Fernandes e do Austin Kleon sobre os commonplace books.

Segundo a Wikipédia:
Commonplace books (or commonplaces) are a way to compile knowledge, usually by writing information into books. They have been kept from antiquity, and were kept particularly during the Renaissance and in the nineteenth century.
Ao contrário do journaling, a ideia do commonplace book não é refletir através da escrita, mas sim recolher fragmentos de conversas, textos, ideias, sons ou seja o que for que, mais tarde, possamos usar como inspiração para outra coisa.
Claro que também podemos fazer esta recolha de referências num formato digital (um exercício que aprendi com o Tiago do Tira do Papel e uso para compor as newsletters mensais), mas, numa fase em que os meus marcadores do browser já estão incrivelmente caóticos, voltar à recolha manual parece-me uma excelente alternativa.
Por onde ando?
Aqui e ali, uns dias mais ali do que aqui. No mundo virtual, estou no LinkedIn e no Instagram.
Aqui, no Substack, podes ler os últimos textos:
Também me podes escrever para lidiatavaresdias@gmail.com
Até fevereiro!
Lídia Parabéns 😊 vou anotar para o ano passar o aniversário a escrever e a comer scones com a Mónica. Achei brilhante!
Quem é de janeiro (acho eu) sofre sempre com o aniversário.
Obrigada pelas tuas partilhas. Identifico-me com muitas das coisas que escreves.
Um dia marcamos uma sessão para escrevermos juntas com a Mónica, deixo o convite. Um beijinho
Parabéns atrasados, Lídia! Gostei muito dos Annual Reports do Mathias Jakobsen, fizeram-me lembrar os Integrity Reports do James Clear, que são uma forma diferente de fazer um balanço anual, tendo por base uma matriz de valores pessoais (infelizmente, deixou de os fazer em 2016, mas ainda dá para consultar três edições). Deixo o link: https://jamesclear.com/integrity