O desabafo surgiu numa conversa com amigas.
Acho que estou pronta para desistir.
O choque, e depois as palavras encorajadoras de quem só me quer empurrar na direção (que considera) certa. Não, não digas isso. Estás só cansada. Não te compares aos outros. Continua, persiste, vais ver que um dia a coisa acontece. Mas será mesmo esse o caminho?
Era uma ideia que andava a marinar há algum tempo, mas punha-a de parte como quem rejeita a parte queimada do peixe no forno. E assim ficou, na gaveta das coisas que não tenho coragem de admitir, até ler esta crónica do Bruno Nogueira.
Desistir é, provavelmente, uma das palavras mais mal compreendidas da língua portuguesa. Ninguém gosta de admitir que desistiu, mas todos já desistimos—mesmo quando fingimos o contrário. Do livro que ficou esquecido na mesa de cabeceira, da dieta que prometemos começar na segunda-feira, ou da promessa de que amanhã acordamos cedo para ir ao ginásio.
Mas, curiosamente, desistir nem sempre é o fracasso que imaginamos. Às vezes, desistir é uma escolha consciente de preservação da própria sanidade. Outras vezes, desistir é apenas admitir que nos enganámos sobre aquilo que realmente queríamos. E está tudo bem nisso.
Desistir, quando bem feito, é uma espécie de arte subtil: não é simplesmente virar costas ao que custa, mas reconhecer aquilo que não faz sentido continuar. Quem nunca abandonou um sonho que não era seu, mas emprestado por outros? Quem nunca sentiu a leveza de largar um peso que, na verdade, nunca quis carregar?
Numa espécie de crise de meia idade, tenho questionado muitas das minhas escolhas, algumas delas não tão intencionais como eu acharia.
Há algo profundamente libertador em desistir sem culpa, sem precisar de se justificar ou dar grandes explicações. Apenas parar, respirar fundo e admitir com serenidade: isto não é para mim. E depois sorrir, porque, ao desistir do que não nos pertence, abrimos espaço para abraçar aquilo que realmente importa—mesmo que, às vezes, isso ainda seja coisa nenhuma.

E se o problema não for desistir, mas sim a forma como olhamos para isso?
Digo ao meu filho mais velho que, se não gosta de determinada atividade, não tem de continuar a praticá-la. Que nada está escrito na pedra e é ok mudar de ideias. Então, porque é tão difícil para mim desistir?
Talvez tenhamos crescido a ouvir que desistir é fraqueza, uma falha de caráter, uma prova de que não fomos suficientemente resilientes. Mas e se for exatamente o oposto? E se desistir for, por vezes, o ato mais corajoso que podemos ter?
Há batalhas que não merecem ser lutadas. Sonhos que, quando os olhamos de perto, nunca foram realmente nossos. Há um tipo de desistência que não é derrota, mas sim maturidade. A capacidade de perceber que insistir, só porque sim, é um desperdício de tempo e energia. É um afundar a cabeça na frustração de nunca conseguir.
No fundo, talvez o que nos assuste na ideia de desistir não seja a desistência em si, mas o vazio que vem depois. O "e agora?" que nos obriga a confrontar a ausência de um plano B. Só que esse vazio pode ser, afinal, o espaço exato onde nasce algo novo.
Então, sim. Talvez esteja pronta para desistir. Mas não por fraqueza—por lucidez.
Foto de capa de Mike Dorner na Unsplash
Às vezes, é preciso mais coragem para desistir do que para persistir. E cada um sabe das suas lutas. Acho que o mais importante é ficarmos em paz com as nossas escolhas, conscientes de que o que hoje é verdade, amanhã pode não ser e estamos sempre a tempo de mudar. (Crise de meia-idade?! Queres mesmo falar sobre isso?!) Bjs!
Tenho-me debatido com algo muito similar, senão mesmo igual ao que descreves aqui. Talvez seja uma questão do estágio de vida e dessa tal crise de meia-idade (embora costume dizer, por piada, que estou em crise de meia-idade desde a adolescência).
Ainda há dias disse uma coisa parecida cá em casa ao que dizes neste texto: às vezes, desistir é mais um acto de coragem do que de fraqueza. Quando chegamos à conclusão que estamos a perseguir determinada coisa porque estamos a seguir o caminho que é suposto seguirmos, que se espera que sigamos, e não porque verdadeiramente queremos seguir, então desistir pode verdadeiramente ser a resposta certa. E, desse ponto de vista, nem chega a ser desistir: é exactamente o oposto, é procurar, é investir, é arriscar, tudo verbos que remetem para a coragem e não para a inação ou fraqueza.